terça-feira, dezembro 03, 2002

Li na Betty (Ah! vai ter festa de aniversário do James nesse sábado... venha, filha!!!)...

o original é está aqui

mas para quem está com preguiça colocarei logo abaixo com letras menores... este texto só vem para confirmar algumas posições minhas e principalmente a minha opinião sobre Arnaldo Antunes.

Tremendo teatrinho tribal

11.Nov.2002 | “Tribalistas” é um prato cheio para quem confunde pose com atitude, invencionice com invenção, ecletismo com mistura. Separados, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Marisa Monte têm méritos mais do que evidentes e cacoetes irritantes. Juntos, prevalecem os últimos nas 13 faixas que, compostas e executadas em conjunto, dão uma boa idéia da milenar arte de dizer/cantar o óbvio com ares de transcendência. Tudo em nome da alegria, tudo em nome do amor e daquela tal mudernidade caô.

“Cor de rosa e carvão”, disco que Marisa lançou em 1994 e que continua sendo o melhor de sua carreira, marca o início destas parcerias entre a cantora que brilha intensamente quando cai no samba, os tambores over da Bahia high-tech e a vanguarda paulista com um pé no rock e outro no concretismo literário. Daquela colaboração saíram belezas como “Maria de verdade” (Brown), “De mais ninguém” (Marisa e Arnaldo) e “Alta noite” (Arnaldo), o que só torna mais cruel a comparação com as composições “coletivas” que às vezes incorporam músicos como Davi Morais ou a cantora Margareth Menezes. Em tudo e por tudo, “Tribalistas” parece uma diluição de encontros que foram realmente surpreendentes e produtivos há 8 anos.

Só uma das 13 canções começa sem ruídos, que vão de água escorrendo a rádio fora de sintonia. Na maioria, o pseudo-estranhamento da introdução é engolido em 15 segundos por melodias bem convencionais e letras que são candidatas sérias às piores lançadas em 2002 – exceções feitas, diga-se logo, a “É você”, “Pecado é lhe deixar de molho” e “Carnalismo”, pois nas três música e palavra evidentemente resistem ao que um poeta de vanguarda como Arnaldo poderia chamar de teatrinho tribal da trinca. Somadas, as canções dão menos de 9 minutos de prazer num tormento que em 41 minutos - e ainda uma versão em DVD - vai do risível ao enervante.

Fica difícil eleger o ponto mais baixo de “Os tribalistas” mas, a começar pelo título, “Mary Cristo” é uma das favoritas. Marisa faz pose de Elizeth Cardoso mas deixaria Sandy envergonhada com “Já nasceu o Deus menino/E as vaquinhas vão mugindo/Blim blom, blim, blom”. Tá certo, é para ser singelo, delicado, mas no verso seguinte vem o toque trocadilhesco: “Blim blom nylon”. Sacaram? E mais singeleza: “Carneirinho me dá lã, mé/Passarinhos de manhã, né”. Uma beleza no mesmo modelito inocência de “Velha infância”, romantismo da complexidade de “Amor I love you”: “Você é assim/Um sonho pra mim/Quero te encher de beijos/Eu penso em você/Desde o amanhecer/Até quando me deito”. Pelo menos pouparam o velho Eça de Queiroz.

“Passe em casa” é a cara de Carlinhos Brown, que no disco toca baixo, balde, pandeiro, “tumbassouras”(sic), conga, caixinha de brinquedo, marimba, cinzeiro, vibrafone, estante de partitura e outros menos votados. Com a colaboração de Margareth Menezes, não faz feio diante da poética axé music com o refrão: “Passe em casa/Tô te esperando, tô te esperando/Estou esperando visita/Tão impaciente e aflita/Se você não passa no morro/Eu quase morro, eu quase morro”. Tudo, é claro, precedido por moderníssimos scratches e pontuados por trocadilhos de deixar Chico César com inveja como o dos versos “Repique tocou/O surdo escutou/E o meu corasamborim” – de “Carnavália”, sucessão de brincadeiras óbvias com nomes de escolas de samba cariocas.

Como a EMI precisa ganhar um dinheirinho e a capa do modernérrimo Vik Muniz não ajuda, a trinca também é popinha em “Já sei namorar”, chicletinho que sobre dois ou três acordes derrama a imortal poesia: “Já sei namorar/Já sei beijar de língua/Agora, só me resta sonhar”. Mas como todo mundo é esperto e crítico pacas, a garotada vai poder mais para frente se sacudir com reflexões frankfurtianas como “Não tenho paciência para televisão/Não sou audiência para a solidão”. Uma espécie de síntese (dialética, é claro) de Kid Abelha com Theodor W. Adorno.

Melhor nem comentar “O amor é feio”, onde entre pianos dissonantes e violões melódicos ouve-se “O amor é sujo/Tem cheiro de mijo/Ele mete medo/Vou lhe tirar disso”. Escrito assim parece bobo, mas cantado guturalmente por Arnaldo soa muito cult numa fórmula que permeia todo o disco: facilidades pueris + esquisitices cosméticas = ouvinte gratificado, que se acha inteligente.

Na música título, eles se dizem, claro, um “antimovimento que vai se desintegrar no próximo momento”. Mas se declaram “saudosistas do futuro”, que ao contrário de Raul Seixas “abusam do colírio e dos óculos escuros” e “são turistas, assim como você e seu vizinho/Dentro da placenta do planeta azulzinho”, momento-Djavânico inesquecível. Dá vontade de sair batendo palmas, cantando o refrão “Pé em Deus/E fé na taba” e começar a ouvir Jorge Vercilo com outros ouvidos.

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